quinta-feira, 6 de junho de 2013

"Há que furar o bloqueio da mídia"

Entrevista com Renato Cosentino, do Comitê Popular Rio Copa e Olimpíadas, conferencista nas Jornadas Bolivarianas, nona edição.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Jornadas Bolivarianas formulam novas teorias

Professor Nilso Ouriques (Unoesc), durante a nona edição das Jornadas Bolivarianas, em Florianópolis, maio de 2013. Para ele, as Jornadas são espaços de formulação de novas teorias.

 

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Um balanço das Jornadas Bolivarianas - 9ª edição

Paulo Capela - Presidente do IELA


     Ao término das Jornadas Bolivarianas - 9ª edição, realizadas de 9 a 12 de abril de 2013, tendo como tema “Megaeventos esportivos: impactos, consequências e legados para o continente latino americano”,  avaliamos seu impacto em diversos aspectos:  divulgação; repercussão no ambiente  interno da UFSC (entre os estudantes, professores, servidores técnico-administrativos, centros de Ensino e cursos de graduação e pós-graduação);  e também seu impacto na comunidade externa à UFSC (na cidade de Florianópolis, no Brasil, etc).

    Mesmo em uma fase de avaliação preliminar, é possível fazer algumas constatações importantes  sobre o evento, dentre as quais destacaria três: (1) a presteza e o empenho demonstrado pelos convidados, conferencistas e coordenadores de mesas, que prontamente atenderam à convocatória do Instituto de Estudos Latino-Americanos (IELA), encontrando-se entre eles 15 personalidades de seis  países (Cuba, Equador, México, Uruguai, África do Sul, Brasil) entre conferencistas e coordenadores das mesas das conferências, pesquisadores de renomados grupos de estudos; (2) o aumento significativo de público em relação à edição anterior, que teve como tema  “O Caribe: espaço estratégico na América Latina”, de grande relevância,  porém ainda pouco estudado no Brasil; (3) a presença massiva de jovens, o que contraria a ideia de que eles não se interessam por política, pelos impactos sociais das políticas públicas sobre a população brasileira, pelos estudos críticos e pelo continente latino-americano.

    Esta avaliação preliminar, por si só, permite-nos afirmar o acerto na escolha do tema e a força das sucessivas edições das Jornadas Bolivarianas no âmbito da UFSC e no mundo externo à universidade.   Gostaria de fazer algumas reflexões pessoais sobre a abordagem dos temas tratados. Na conferência de abertura, na noite de 9 de abril,   proferida pelo professor Jaime Breilh, assistimos a uma aula magna da aplicação do método marxista como instrumento para desvelar as tramas sociais envolvendo os megaeventos esportivos, o que inclui sua estrutura macroeconômica, os diversos grupos de interesse em seu entorno, chegando finalmente a uma síntese na qual o professor conferencista aponta as implicações que as determinantes sociais advindas deste fenômeno econômico acarretarão para a saúde das populações latino-americanas e para os atletas participantes.

    A exposição de Breilh ampliou-se ao proferir, dois dias depois, a aula inaugural para o curso de pós-graduação em Serviço Social, ocasião em que este método foi mais detalhadamente tratado junto aos profissionais da área da saúde. Seguiu-se à conferência de abertura, no segundo dia,  10 de abril,  pela manhã, a mesa em que o professor Maurício Roberto da Silva coordenou, de forma brilhante, a exposição de dois outros conferencistas – Antonio Becali Garrido, reitor da Universidade de Ciências da Cultura Física e Esportes de Cuba, e Fernando Mascarenhas, professor da Faculdade de Educação Física da Universidade de Brasília (UnB). A conferência tratou das responsabilidades do Estado diante das históricas demandas dos movimentos sociais na formatação das políticas públicas de esporte e lazer, a fim de contemplar os direitos sociais das populações frente aos megaeventos esportivos. A abordagem dada pelos dois conferencistas assumiu caminhos diferentes e muito interessantes.

    Antônio Becali refletiu sobre a necessidade de uma megapreparação dos atletas para os megaeventos, a fim de garantir o respeito do país para com seus atletas e dos atletas para com a tradição e os valores de seus povos.  Ele apontou 16 indicadores de excelência necessários para técnicos e comissões técnico-científicas de alto-rendimento, competências sem as quais entende ser irresponsável um país submeter seus atletas a altas performances olímpicas. O professor Fernando Mascarenhas desvelou, com maestria e refinamento metodológico-científico, os bastidores da relação entre o Estado brasileiro e as organizações esportivas, mostrando em sua síntese a utilização ideológica inconsequente dos megaeventos esportivos no ambiente da política do PCdoB e do PT, em especial no governo Lula. Construiu em sua exposição um cenário que nos permitiu perceber estarmos vivendo uma política pública esportiva de caráter desenvolvimentista. Ela traz para o país e para o continente latino-americano os megaeventos Copa do Mundo 2014 e Olimpíadas 2016, entre outros, cujos grandes beneficiários serão novamente os grupos empresariais nacionais e transnacionais, e não o povo. Portanto, trará o desenvolvimento do subdesenvolvimento esportivo e econômico à população brasileira.   

    A conferência da noite teve como tema “A mídia, o jornalismo esportivo e a cobertura dos megaeventos esportivos”.     Diante da especificidade do tema, foi feito convite aos pesquisadores do Labomídia (Laboratório de Estudos sobre Esporte e Mídia do CDS/DEF/UFSC) para coordenação da mesa, representado na coordenação da mesa pelo professor Fernando Bittencourt. Com discrição e harmonia, Fernando conduziu a conferência do jornalista Juca Kfouri, que com sua fala abrilhantou a noite por mais de uma  hora, mostrando com fatos de sua vivência jornalística como vem sendo tratado o tema das políticas públicas de esporte e lazer pelas sucessivas administrações do Estado (governos Lula e FHC) e pelas elites esportivas “encasteladas” nos órgãos governamentais brasileiros, nas federações, nas confederações, no Comitê Olímpico Nacional e nos comitês organizadores da Copa 2014 e das Olimpíadas 2016.

     Se faltou um debate mais aprofundado sobre temas afetos à indústria cultural, à mídia, e ao jornalismo esportivo,  sobraram deste grande profissional exemplos de ousadia, coragem e comprometimento com a verdade. Kfouri há muito tempo insurge sua voz, como poucos profissionais de sua área, contra as “falcatruas” promovidas pelas elites esportivas antipovo do Brasil e do mundo. No terceiro dia, 11 de abril, na conferência da manhã, sob a coordenação do professor Nildo Ouriques,  um dos principais  expoentes do pensamento latino-americano do IELA, fomos brindados  com a presença de  dois grandes conhecedores do ambiente econômico dos esportes – professores Marcelo Proni, da Universidade Estadual de Campinhas/Unicamp, e Nilso Ouriques, da Universidade Estadual do Oeste de Santa Catarina/Unoesc/Joaçaba. Marcelo Proni fez uma exposição didática sobre o processo histórico de transformação das Copas do Mundo de Futebol e Olimpíadas, demarcando as diferentes formas assumidas por esses eventos,  tanto como espetáculo de interação dos povos quanto como  instrumento de acumulação capitalista (negócio). Proni encerrou sua fala analisando os megaeventos esportivos midiáticos,  assumidos pela Copa do Mundo de Futebol e pelas Olimpíadas,  como forma mais evoluída de mercadoria.

              Na sequência, Nilso Ouriques baseou os eixos de sua fala nos horizontes da teoria da acumulação capitalista exercida pelos países centrais sobre os países periféricos em uma operação de expropriação econômica daqueles sobre esses. O coordenador da mesa, professor Nildo Ouriques, valendo-se de seu acúmulo teórico sobre o tema, praticamente propiciou uma terceira conferência ao comentar e ampliar os temas trazidos à mesa pelos conferencistas convidados. Suas observações apontaram para um claro caminho:  o da recuperação das teses do projeto nacional popular latino-americano para fazer a crítica e indicar a superação da forma econômica dos megaeventos esportivos. Sugeriu, inclusive, que se iniciasse no Brasil um grande movimento de caráter mundial pelo fim deste modelo de promover o esporte e a integração entre os povos.

    À noite, sob a coordenação da jornalista do IELA Raquel Moysés, os conferencistas Eddie Cottle (África do Sul) e Raumar Rodrigues Gimenez (Uruguai) nos mostraram os horizontes esportivos de seus países. Eddie Cottle trouxe-nos à reflexão a inconsequência e a falácia dos chamados legados da Copa do Mundo de 2010 na África do Sul (e continente africano). Segundo ele, além de não produzirem os propagados legados, os megaeventos geram frentes de trabalho nocivas aos trabalhadores da construção civil, uma vez que os exíguos prazos para a realização das obras levam à exaustão de suas forças, promovendo, por outro lado, altos lucros à indústria da construção.

    Esse fato gerou greves motivadas, em especial,  pelo fato de os trabalhadores sul-africanos não aceitarem que seus salários fossem regulados por índices de inflação oficiais. Eles protagonizaram debates sobre a correção de seus salários a partir dos lucros obtidos pela classe empresarial, além de reivindicarem condições de segurança e moradia digna, entre outros temas. Essa mobilização, por sua vez, gerou uma metodologia de organização e resistência dos trabalhadores da construção civil, exportada para os trabalhadores do Brasil e do mundo – legado popular significativo como instrumento de resistência, luta e defesa da vida dos trabalhadores em suas relações com o capitalismo que orbita ao redor dos megaeventos esportivos.

    O professor Raumar expôs o processo histórico de construção do civismo, nacionalismo, controle social e ideológico no Uruguai,  por meio das práticas esportivas.
    Encerrando a nona edição das Jornadas Bolivarianas, sob a coordenação do professor Fábio Pinto, referência no ensino de educadores populares e na estruturação de núcleos de capoeira Angola em comunidades economicamente empobrecidas da Ilha de Florianópolis, tivemos, no dia 12 de abril, a conferência do jornalista Mauricio Mejía, do México, e de Renato Consentino Vianna Guimarães, do Comitê Popular Rio Copa e Olimpíadas/Brasil. Mejía mostrou, por meio de dados, que mesmo o México tendo sediado duas Copas do Mundo de Futebol (1970 e 1986) e uma Olimpíada (1968) não houve alterações significativas no índice de diminuição de pobreza nem no aumento de práticas esportivas em seu país. Apontou a necessidade de fazer a crítica ao sistema olímpico que aprisionou e empobreceu as dimensões lúdicas e de humanização do esporte.

    Renato Guimarães trouxe imagens, dados e relatos de moradores do Rio de Janeiro,  que mostram a perversidade das desapropriações, demolição de equipamentos esportivos e do erguimento de muros para esconder favelas - tudo em nome dos megaeventos esportivos. Segundo ele, um instrumento simbólico e econômico de opressão e legitimação do avanço da especulação imobiliária sobre as áreas públicas e as populações urbanas economicamente empobrecidas.      A mensagem final, deixada por esta última mesa, aponta para a necessidade de fortalecer os movimentos sociais e promover ações diretas para barrar os abusos que vêm sendo cometidos contra as populações.

    Para nós, do IELA, as Jornadas não são apenas eventos, devendo gerar processos de ação social  mais amplos. Nesse sentido, destacamos os seguintes encaminhamentos:
•    Empenho na formalização de convênios de intercâmbio da UFSC com as Universidades de Havana/Cuba e Andina Simón Bolívar (Quito/Equador) para continuarmos tratando de temas científicos envolvendo nossos grupos de pesquisa. Por meio de portal,  já existente na Universidade Andina Simón Bolívar, também será constituído um “link” para divulgação de temas referentes aos megaeventos Copa do Mundo 2014 e Olimpíada 2016 no Brasil para países da América Latina de língua espanhola. Essa ação atingirá 50 mil  pessoas e 25 universidades.
•    Realização, no segundo semestre de 2013, de um fórum dos municípios de Santa Catarina do campo da esquerda para tratar do tema das proposições de políticas públicas do Estado. Na ocasião, também será oficializada a constituição do movimento pela democratização do esporte e lazer no Estado, que contará com a presença de movimentos sociais, sindicatos, professores universitários, secretaria estadual do Colégio Brasileiro de Ciências dos Esportes/CBCE e representantes de diversos segmentos da comunidade esportiva.
•    Pretendemos, no prazo máximo de três meses, enviar  para publicação o livro com os textos das conferências das Jornadas Bolivarianas -  9ª edição.
•    Encontra-se, sob avaliação, o livro de Eddie Cottle – “South África`s Wold Cup: A Legacy For Whom?” (“Copa do Mundo da África do Sul: um legado para quem?”)– a fim de traduzi-lo para a língua portuguesa. O autor autorizou também que,   se sair  uma  edição em português,  haja a complementação de sua obra com texto a respeito das críticas feitas ao esporte pelo campo crítico da Educação Física brasileira, a ser produzido por membros do Vitral Latino-Americano de Educação Física, Esporte e Saúde, um dos núcleos do IELA. 

    Apontamos,  como fato negativo, a absoluta ausência de integrantes/representantes dos meios de comunicação esportivos de Florianópolis e região e de dirigentes esportivos, que insistem em se manter alheios a toda e qualquer manifestação científica contrária aos interesses das classes dominantes. Por fim, deixamos nossos mais sinceros agradecimentos a todos que se empenharam  para a efetivação das Jornadas Bolivarianas, em sua nona edição.